Procurar entender a família a partir de uma visão meramente biológica é ignorar todos os avanços culturais experimentados pelo homem nos últimos tempos. A quem cabe dizer o que é uma família? Ao direito? À sociedade – que parte dela?… Qual é a importância disso para a sua vida?
Você pode até não se importar com aquilo que os outros venham a pensar sobre suas escolhas amorosas, mas saiba que a maneira como o sistema jurídico as “classifica” pode ter efeitos concretos para o seu bem-estar ou seu patrimônio.
Nos tempos atuais, talvez o melhor parâmetro para buscar saber da existência de uma entidade familiar seja o “afeto”. Existem famílias sem afeto? Sem dúvida que sim. Mas com a mesma certeza olhamos para isso como quem olha para algo disfuncional. Porque a família é o berço das primeiras interações do ser humano com seus semelhantes e com o mundo! E quanto tempo levamos para termos autonomia em relação ao nosso núcleo familiar? Esse grau de dependência transforma a família na primeira “forma” do futuro ser. É sobretudo em seu seio, com participação da sociedade, que nos desenvolvemos física e psiquicamente e nos tornamos quem somos.
A maneira como as pessoas se relacionam e moldam seus estilos de convivência variam ao longo da história e de uma sociedade para outra. Nos tempos atuais, são variadas as formas de as pessoas se relacionarem e, com base nisso, devemos estar, na mesma medida, abertos a variadas formas de família.
Entre nós, já se foi o tempo em que a família era inaugurada pelo casamento… No direito brasileiro, as diferenças entre “casamento” e “união estável” estão cada vez mais no plano teórico. Quanto aos “efeitos jurídicos”, a união estável praticamente ocupou o mesmo espaço reservado ao casamento. Neste sentido, a Constituição Federal de 1988 (CF/1988) foi fundamental, por fincar o princípio da dignidade da pessoa humana como um dos pilares de nossa sociedade. Foi graças a isso que, em mai/2011, por exemplo, numa decisão histórica, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a possibilidade de haver “união estável” entre pessoas de mesmo sexo.
Leigos na área jurídica até podem estranhar tal notícia. Afinal, há muito tempo existem casais homoafetivos… No entanto, são relativamente recentes as decisões que conferem efeitos jurídicos a tais uniões.
Isso demonstra que, em termos de regulação das relações familiares, normalmente as normas jurídicas vêm a reboque: as práticas sociais costumam estar um ou mais passos à frente… Ilustração disso é a multiparentalidade. Há alguns anos, quem poderia imaginar a possibilidade de se ter, no registro civil, o nome de dois pais ou de duas mães? Isso já é amplamente aceito pelos tribunais brasileiros, sinal de que o “afeto” vem ganhando a mesma dimensão tradicionalmente atribuída ao “biológico”. Em outras palavras, é o reconhecimento da cultura enquanto fator de constituição do humano.
Também devemos à CF/1988 a proibição da distinção entre filhos. Antes de seu advento, existiam os filhos “legítimos” (havidos dentro do casamento) e os “ilegítimos” (fora dele). Desde nossa Lei Maior, filhos são filhos, sem qualquer distinção jurídica, mesmo que a discriminação eventualmente exista, num caso concreto, sob o ponto de vista moral.
Apesar de tantos avanços, são conhecidas algumas fronteiras em que as práticas sociais ainda desafiam o direito. É o caso das uniões estáveis mantidas em paralelo ao casamento, ou ainda o da chamada “poliafetividade” ou “poliamor” (uniões estáveis mantidas entre três ou mais pessoas), sem falar das questões envolvendo animais, havendo quem os considere como “membros da família”.
Como se vê, o tema é tão complexo quanto o ser humano e suas formas de se relacionar e expressar afetividade. Só isso já justifica a importância de, em assuntos dessa ordem, buscar assessoria junto a profissional especializado na área.
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