Mãe de paciente morto após cirurgia de apendicite será indenizada por plano de saúde

Mãe de paciente morto após cirurgia de apendicite

A 6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo aumentou indenização devida por plano de saúde à mãe de paciente que, após sucessivas falhas médicas, retardo no diagnóstico e deficiência técnica do hospital, faleceu de apendicite. O valor dos danos morais foi majorado de R$ 100 mil para R$150 mil.

Conforme os autos, a autora da ação teria levado o filho, à época com 29 anos, para hospital de propriedade do plano de saúde. Com fortes dores abdominais, o paciente foi encaminhado para realização de exame de raios X e liberado. As dores persistiram, motivo pelo qual retornaram ao hospital no dia seguinte. O paciente recebeu diversos diagnósticos de diferentes médicos do hospital e, alguns dias depois, foi encaminhado para cirurgia em função do quadro de apendicite aguda. Após a realização da cirurgia, o estado de saúde do paciente se agravou, ocorrendo parada cardíaca e o consequente óbito.

De acordo com laudo pericial, houve falha no atendimento, pois cada vez que se chamava o médico vinha um diferente que nada sabia a respeito do caso. Além disso, analisou-se a “total falta de condições técnicas” do hospital para atender casos delicados e graves, como o ocorrido. De acordo com o documento, o único exame que poderia diagnosticar uma apendicite, uma tomografia computadorizada, não foi sequer solicitado, pois o serviço é oferecido em outro prédio. “O local onde se encontrava internado o paciente não dispunha do equipamento. Indiscutivelmente deveriam ter providenciado sua remoção para que tal exame fosse realizado, o que sequer foi aventado pelo corpo clínico que o atendeu”, escreveu a relatora do recurso, desembargadora Cristina Medina Mogioni.
A magistrada ainda acrescentou que a vida não tem valor mensurável e que

“a indenização que se reclama, quando a vida é ceifada tragicamente, não tem, como é óbvio, caráter substitutivo, mas visa compensar as angústias, os constrangimentos, as dores, as aflições resultantes do ato lesivo e, por outro, reprimir a conduta do responsável pelo evento morte, para que, doravante, seja mais diligente e cauteloso”,

concluiu.
O julgamento, unânime, contou com a participação dos desembargadores Eduardo Sá Pinto Sandeville e José Roberto Furquim Cabella.

Processo nº 0029684-16.2012.8.26.0562

Exclusão de cobertura securitária em complicações de gravidez e tratamentos médicos é abusiva

Exclusão de cobertura securitária

Ao negar provimento a um recurso de uma seguradora, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que considerou nulas cláusulas contratuais de exclusão de cobertura do seguro de acidentes pessoais ofertado pela companhia.

O colegiado considerou correta a conclusão de que as complicações decorrentes de gravidez, parto, aborto, perturbações e intoxicações alimentares, intercorrências ou complicações consequentes da realização de exames, tratamentos clínicos ou cirúrgicos constituem eventos imprevisíveis, fortuitos e inserem-se na modalidade de acidente pessoal. Na visão do TJSP, qualquer cláusula excludente do conceito de acidente pessoal relacionada a tais complicações é efetivamente abusiva, porque limita os direitos do consumidor.

A seguradora alegou no recurso ao STJ que as cláusulas declaradas nulas são compatíveis com a boa-fé e com a equidade e não colocam os consumidores em desvantagem exagerada. Afirmou ainda que houve julgamento além do pedido (ultra petita), pois a ação civil pública, movida pela Associação Nacional de Defesa da Cidadania e do Consumidor, teria sido proposta apenas em relação às cláusulas que versavam sobre morte e invalidez.

Para a relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, não há julgamento ultra petita quando o julgador interpreta o pedido formulado na petição inicial de forma lógico-sistemática, a partir da análise de todo o seu conteúdo. Segundo a relatora, a nulidade das demais cláusulas foi declarada de acordo com a lógica do pedido inicial.

Cláusulas prejudiciais

No voto, acompanhado pelos demais ministros da turma, Nancy Andrighi concluiu que as cláusulas inseridas no contrato prejudicam o consumidor.

“Inserir cláusula de exclusão de risco em contrato padrão, cuja abstração e generalidade abarquem até mesmo as situações de legítimo interesse do segurado quando da contratação da proposta, representa imposição de desvantagem exagerada ao consumidor, por confiscar-lhe justamente o conteúdo para o qual se dispôs ao pagamento do prêmio”,

afirmou.

Segundo Nancy Andrighi, tais cláusulas violam a boa-fé contratual, pois não se pode atribuir ao aderente a ocorrência voluntária de um acidente causado pela ingestão de alimentos ou por eventos afetos à gestação.

Sobre a exclusão de cobertura em todas as intercorrências ou complicações decorrentes da realização de exames ou tratamentos, a ministra disse que a cláusula é genérica demais, já que

“poderia abarcar inúmeras situações que definitivamente não teriam qualquer participação do segurado na sua produção, como, por exemplo, um choque anafilático no curso de um tratamento clínico”.

A relatora deu razão à entidade autora da ação civil pública quanto ao argumento de que é preciso combater a generalização das hipóteses de exclusão, para que as seguradoras não se furtem à responsabilidade de indenizar nas hipóteses de acidente.

Leia o acórdão

REsp 1635238

Réu que disponibilizou livros na internet sem autorização deverá indenizar associação de editoras

Réu que disponibilizou livros na internet

A 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve decisão que condenou dono de site por disponibilizar, na internet, sem autorização, acesso a conteúdos de obras literárias. Elas deverão ser retiradas do sítio eletrônico, bem como o réu deverá pagar à associação de editoras autora da ação montante correspondente ao preço de mercado de 3 mil exemplares.

O réu disponibilizou livros de Direito e Administração. No entanto, a Lei de Direitos Autorais (Lei nº 9.610/98) assegura direitos morais e patrimoniais sobre as obras, definindo o que é ou não permitido a título de utilização e reprodução, bem como quais são as sanções civis a serem aplicadas aos infratores. De acordo com o relator da apelação, desembargador José Aparício Coelho Prado Neto,

“restou comprovada a disponibilização dos livros sem autorização das editoras titulares dos direitos autorais”.

“Ainda que inexista prova da vantagem econômica direta do réu em razão da disponibilização das obras literárias, é certo que tal prática causa impacto na venda dos livros originais, publicados pelas editoras associadas à autora, causando prejuízos a todos titulares dos direitos autorais, fato que enseja a reparação de danos”,

escreveu o magistrado.
O julgamento, unânime, teve a participação dos desembargadores Edson Luiz de Queiróz e José Carlos Costa Netto.

Processo nº 1117324-63.2015.8.26.0100

Interesse do menor não pode ser invocado para justificar adoção irregular sem consentimento dos pais

Interesse do menor não pode ser invocado

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a um recurso para julgar improcedente o pedido de guarda formulado por casal que manteve irregularmente uma criança por mais de sete anos e determinou sua entrega imediata aos pais biológicos. O colegiado considerou que o argumento do melhor interesse do menor não justifica a guarda em caso de desrespeito a acordos e ordens judiciais.

Segundo o processo, a menor, logo após o nascimento, foi levada do hospital sem a autorização dos pais por um tio paterno que, agindo em conluio com o conselho tutelar local, entregou-a a um casal – o qual figura como recorrido no recurso especial julgado pelo STJ. Tudo foi feito sob a justificativa de que os pais seriam andarilhos e usuários de drogas, e a entrega da criança a outro casal evitaria o risco de ela acabar em um abrigo.

O tribunal de segunda instância deu a guarda da criança ao casal que a adotou informalmente, considerando que a situação consolidada por longo período de tempo gerou um vínculo afetivo caracterizador de relação paterno-filial, cujo rompimento ofenderia o princípio do melhor interesse do menor.

A relatora do caso no STJ, ministra Nancy Andrighi, disse que os pais biológicos rapidamente se restabeleceram, tornando-se aptos a cuidar da filha, e não há nos autos nenhuma informação que os desabone ou autorize que sejam destituídos. Ela destacou que a situação foi estabelecida sobre bases insustentáveis, causando graves prejuízos à criança e aos pais biológicos.

“Eles não puderam acompanhar os primeiros olhares, as primeiras palavras e os primeiros passos. E perderam todos esses momentos não porque quiseram, mas porque foram reiteradamente tolhidos de querer e, consequentemente, foram tolhidos de amar em sua plenitude, embora os seus comprovados esforços demonstrem que nunca desistiram de ser pais”,

afirmou.

Situação artificial

Segundo a ministra, não se pode compactuar com algo artificialmente desenvolvido sobre o “terreno pantanoso das inverdades”.

“A ruptura entre o que se afirma ser e o que efetivamente é, normalmente, é dolorosa, mas, ainda assim, será sempre mais benéfica do que o mais simples e doce sofisma, pois amor sem liberdade não é amor, mas sim mera posse, quando não indevido cárcere”,

acrescentou.

Nancy Andrighi disse que a decisão de negar o pedido de guarda não é a desconstrução de um vínculo, mas, sim, o fim de uma fraude que perdura por mais de sete anos para que a verdade seja restabelecida.

A relatora destacou que a situação analisada não tem semelhança com os casos de adoção à brasileira julgados pelo STJ, que algumas vezes permitem a flexibilização da regra da adoção. Segundo ela, o princípio do melhor interesse do menor não pode e não deve ser interpretado como uma espécie de metanorma que a tudo serve e tudo resolve.

“A aplicação do princípio do melhor interesse do menor se relaciona, mais adequadamente, às situações de lacuna legal ou, especialmente, à solução de conflitos entre regras jurídicas potencialmente antinômicas, servindo, como leciona Robert Alexy, como um mandamento de otimização que ordena que algo seja realizado na maior medida possível.”

De acordo com a ministra, o princípio do melhor interesse do menor deve ser lido não apenas sob a perspectiva do que eventualmente ganhou na relação estabelecida com os adotantes, mas, também e principalmente, sob a ótica daquilo que a menor deixou de ganhar ao ser repentinamente arrebatada de sua família biológica.

Sucessivas manobras

Nancy Andrighi destacou que o casal recorrido efetuou sucessivas manobras para não cumprir o acordo para devolver a criança, inclusive ocultando-a durante a tentativa de cumprimento de ordem de busca e apreensão até a obtenção de uma liminar para permanecer com a guarda provisória.

“Os atos praticados pelos recorridos são muito graves, pois dizem respeito à efetiva participação, ou ao menos a conivência, com a retirada irregular de uma recém-nascida de um hospital, contrariamente aos interesses de seus pais biológicos, somada a uma manobra processual consistente em celebrar um compromisso de entrega da criança, sucedido por um recurso contra a decisão homologatória do acordo e posterior ocultação da menor por ocasião da busca e apreensão determinada judicialmente”,

declarou a relatora.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Segunda Seção fixa teses sobre contratos bancários em repetitivo que atinge quase 400 mil ações

Segunda Seção fixa teses sobre contratos bancários
Em julgamento de recursos especiais submetidos ao rito dos repetitivos (Tema 958), a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou tese no sentido de considerar abusiva, em contratos bancários, a cláusula que prevê ressarcimento de serviços prestados por terceiros sem a especificação do serviço a ser efetivamente executado.

O colegiado também julgou abusiva a cláusula que prevê ressarcimento, pelo consumidor, da comissão do correspondente bancário, nos casos de contratos celebrados a partir de 25 de fevereiro de 2011 – data de entrada em vigor da Resolução CMN 3.954/2011 –, sendo válida a cláusula no período anterior à resolução, ressalvado o controle da onerosidade excessiva.

Por fim, a seção também fixou tese no sentido da validade da tarifa de avaliação do bem dado em garantia, bem como da cláusula que prevê o ressarcimento de despesa com registro do contrato, ressalvadas as hipóteses de reconhecimento de abuso por cobrança de serviço não efetivamente prestado e a possibilidade de controle da onerosidade excessiva em cada caso concreto.

Com o julgamento dos repetitivos, mais de 395 mil ações que estavam suspensas poderão agora ter seu processamento retomado e deverão ser resolvidas de acordo com as teses estabelecidas. As informações sobre os processos suspensos estão registradas no Banco Nacional de Dados de Demandas Repetitivas e Precedentes Obrigatórios do Conselho Nacional de Justiça.

Delimitação

Relator dos recursos repetitivos, o ministro Paulo de Tarso Sanseverino destacou que a análise das controvérsias jurídicas seria delimitada aos contratos bancários firmados no âmbito das relações de consumo, com instituições financeiras ou equiparadas, ainda que por intermédio de correspondente bancário, celebrados a partir de 30 de março de 2008, data do início da vigência da Resolução CMN 3.518/2007, que disciplinou a cobrança de tarifas pela prestação de serviços financeiros. O normativo foi posteriormente revogado.

Para os contratos celebrados em data anterior, explicou o ministro, não foi identificada multiplicidade de recursos capaz de justificar a fixação de tese pelo rito dos recursos repetitivos.

Serviços de terceiros

Em relação às despesas de serviços de terceiros, o relator apontou que o ressarcimento era autorizado expressamente pela Resolução 3.518/2007 do Conselho Monetário Nacional (CMN). Apesar dessa norma, o Banco Central entendia que não poderia haver cobrança pelo serviço de correspondente bancário, pois ele atua como preposto da instituição financeira, e não como terceiro.

Mesmo assim, disse o ministro, o mercado de serviços bancários adotou a prática de cobrar do consumidor a comissão do correspondente bancário, como se fosse um serviço autônomo. Por isso, o CMN institui, por meio da Resolução 3.954/2011, vedação expressa à cobrança de tarifa, comissão, ressarcimento ou qualquer forma de remuneração pelo fornecimento de produtos ou serviços por meio de correspondente bancário.

Dentro desse cenário normativo, no caso das cobranças genéricas de ressarcimento de serviços prestados por terceiro, Paulo de Tarso Sanseverino afirmou que a prática afronta o Código de Defesa do Consumidor (CDC), uma vez que não descreve o serviço especificamente prestado por terceiro.

O ministro também ressaltou que a especificação do serviço contratado é direito previsto no artigo 6º do CDC, assim como o direito à informação adequada sobre eventuais acréscimos no financiamento.

“Com base nesses enunciados normativos, verifica-se que a cobrança genérica por serviços prestados por terceiros, além de não encontrar amparo na regulação bancária, malfere o Código de Defesa do Consumidor”, apontou o ministro.

Correspondentes bancários

Segundo Sanseverino, o Banco Central reconheceu que, antes de 2011 (quando a Resolução CMN 3.954 vedou a cobrança pelo serviço do correspondente bancário), havia certa “ambiguidade” ou “zona cinzenta” em relação a esse tipo de cobrança, fato que justificou a não aplicação de sanções administrativas às instituições financeiras.

Por esse motivo – e com base em julgamento da Segunda Seção que, ao analisar o Tema 618, entendeu serem válidas a Tarifa de Abertura de Crédito e a Tarifa de Cadastro no período em que não estavam vedadas –, o ministro concluiu que o ressarcimento por serviço de correspondente bancário deveria ser considerado abusivo nos contratos celebrados a partir de 25 de fevereiro de 2011.

Todavia, mesmo antes dessa data, apesar de ser considerada válida a pactuação da cobrança, ainda permanece a possibilidade de controle no caso da configuração de ônus excessivo para o consumidor.

Registro e avaliação

No caso das despesas de registro do contrato e da tarifa de avaliação do bem, o ministro Sanseverino apontou que tais cobranças, em tese, não conflitam com a regulação bancária. Entretanto, fez ressalvas sob a ótica do consumidor, como a hipótese de abuso na cobrança por serviço não prestado.

Segundo o relator, essa questão é frequente em relação à tarifa de avaliação do bem dado em garantia, pois muitas vezes os consumidores são cobrados pela avaliação sem que tenha havido comprovação desse serviço.

“Ressalvada a efetiva avaliação do bem dado em garantia, é abusiva a cláusula que prevê a cobrança desse tipo de tarifa sem a efetiva prestação do serviço, pois equivale a uma disposição antecipada de direito pelo consumidor (o direito de somente pagar por serviço efetivamente prestado). É dizer que o consumidor paga antecipadamente por um serviço (avaliação do veículo) que não será necessariamente prestado”, afirmou o relator, que também aplicou o mesmo entendimento à tarifa de registo de contrato.

Leia o acórdão

REsp 1578553
REsp 1578526
REsp 1578490

Rede social é condenada a indenizar vítima de perfil falso

Rede social é condenada a indenizar
A 1ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo confirmou sentença da 2ª Vara Cível de Americana que condenou a rede social Facebook a remover um perfil falso alusivo a médico e a pagar indenização à vítima no valor de R$ 10 mil, a título de danos morais.

Consta dos autos que o autor ajuizou a ação pretendendo a remoção da página que utilizava seu nome e de sua clínica médica com informações inverídicas e postagens de usuários que se diziam clientes hostilizando seu trabalho e colocando em dúvida sua ética profissional. O requerente alegou que já havia denunciado o perfil e enviado notificação à ré, mas não obteve resposta que solucionasse a questão, causando-lhe desgaste físico e moral.

Em sua decisão, a relatora da apelação, desembargadora Christine Santini, afirmou que, como regra geral, os provedores de aplicação não exercem controle editorial sobre o teor das publicações de seus usuários, mas,

“quando notificado acerca do caráter lesivo de determinado conteúdo disponibilizado por seus usuários, permanece inerte, mantendo o teor abusivo acessível, restará configurada sua responsabilidade, decorrente de tal omissão”,

disse.

“É evidente que a inércia da apelante na remoção da página na qual veiculadas informações de caráter ofensivo ao autor e sua clínica veio a prejudicar sua imagem e reputação profissional, sofrendo o autor danos em sua integridade moral, razão pela qual se mostra imperiosa a condenação ao pagamento de indenização por danos morais”,

escreveu a magistrada.

O julgamento foi unânime e contou com a participação dos desembargadores Rui Cascaldi e Francisco Eduardo Loureiro.

Apelação nº 1005716-75.2016.8.26.0019

Embriaguez do condutor não afasta dever da seguradora de indenizar terceiro vítima de acidente

Embriaguez do condutor
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou recurso de uma seguradora e manteve a indenização a terceiro que teve o caminhão atingido pelo veículo do segurado, conduzido por motorista alcoolizado, na condição de preposto. Condenada solidariamente com o segurado a indenizar o prejuízo material do terceiro, a seguradora requereu que apenas o segurado fosse responsabilizado pela reparação.

O colegiado, entretanto, entendeu que o seguro de responsabilidade civil não diz respeito apenas à obrigação de reembolso de indenizações do segurado, mas possui função social no sentido de garantir os direitos da vítima, a qual seria duplamente penalizada com a exclusão da cobertura securitária.

Para o ministro Villas Bôas Cueva, relator do processo,

“deve ser dotada de ineficácia para terceiros”

a cláusula do contrato que exclui da cobertura securitária a hipótese de acidente de trânsito causado por embriaguez do segurado ou da pessoa a quem ele tenha confiado a direção do veículo.

“Solução contrária puniria não quem concorreu para a ocorrência do dano, mas as vítimas do sinistro, as quais não contribuíram para o agravamento do risco”,

completou.

Colisão frontal

O motorista que dirigia o caminhão do segurado apresentava embriaguez de 0,46 ml de álcool por litro de ar. Ele invadiu a pista contrária, colidindo frontalmente com outro caminhão que transitava no sentido oposto. Alegando perda total do cavalo mecânico, o terceiro ajuizou ação requerendo reparação do prejuízo, avaliado em R$ 164 mil.

O juízo de primeiro grau entendeu não ter sido comprovado que a ingestão de álcool tenha contribuído para a ocorrência do acidente e determinou que a seguradora pagasse a indenização. O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), mantendo a condenação no valor da apólice do seguro, ressaltou que, mesmo se comprovada a embriaguez, a seguradora tem a obrigação de cobrir os prejuízos causados a terceiros.

No recurso especial ao STJ, a seguradora sustentou que, devido ao estado de embriaguez do condutor do veículo do segurado, deveria ser aplicada a cláusula contratual de exclusão. Para a seguradora, a direção sob efeito de álcool violou a boa-fé objetiva do contrato de seguro, consagrada no artigo 768 do Código Civil.

Nova reflexão

O ministro Villas Bôas Cueva lembrou que a Terceira Turma já havia adotado o entendimento segundo o qual a direção por condutor alcoolizado, seja o segurado ou outro motorista, já representa agravamento do risco contratado, tornando lícita a exclusão de cobertura securitária. No entanto, o caso dos autos não se refere à reparação ao próprio segurado, mas à cobertura de responsabilidade civil, também presente nos seguros de automóvel.

“O tema merece nova reflexão, tendo em vista que nesta espécie securitária não se visa apenas proteger o interesse econômico do segurado relacionado com seu patrimônio, mas, em igual medida, também se garante o interesse dos terceiros prejudicados à indenização, ganhando relevo a função social desse contrato”,

concluiu o relator.

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REsp 1738247

Terceira Turma mantém bloqueio de passaporte como meio coercitivo para pagamento de dívida

Terceira Turma mantém bloqueio de passaporte

Em virtude da ausência de indicação, pelo devedor, de meios menos onerosos e mais eficazes para a quitação da dívida, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deixou de reconhecer ilegalidade em decisão judicial de restrição de saída do país como medida constritiva indireta para pagamento voluntário do débito. Ao negar habeas corpus ao devedor, o colegiado ressalvou a possibilidade de modificação posterior da medida de constrição caso venha a ser apresentada sugestão alternativa de pagamento.

“Sob a égide do Código de Processo Civil de 2015, não pode mais o executado se limitar a alegar a invalidade dos atos executivos, sobretudo na hipótese de adoção de meios que lhe sejam gravosos, sem apresentar proposta de cumprimento da obrigação exigida de forma que lhe seja menos onerosa, mas, ao mesmo tempo, mais eficaz à satisfação do crédito reconhecido do exequente”,

afirmou a relatora do recurso em habeas corpus, ministra Nancy Andrighi.

Meio processual

No mesmo julgamento, o colegiado entendeu não ser possível questionar, por meio de habeas corpus, medida de apreensão de carteira nacional de habilitação também como forma de exigir o pagamento da dívida, tendo em vista que o habeas corpus, necessariamente relacionado à violação direta e imediata do direito de ir e vir, não seria a via processual adequada nesse caso.

No pedido de habeas corpus, o devedor questionava decisão do juiz de primeira instância que suspendeu sua carteira de habilitação e condicionou o direito de o paciente deixar o país ao oferecimento de garantia.

O pedido foi negado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, que concluiu que o habeas corpus estaria sendo utilizado como substituto de recurso, já que a decisão de primeira instância teria sido anteriormente impugnada por meio de agravo de instrumento.

Em recurso dirigido ao STJ, o devedor alegou que o habeas corpus seria a via adequada para conter o abuso de poder ou o exercício ilegal de autoridade relacionado ao direito de ir e vir, situação encontrada nos autos, já que houve o bloqueio do passaporte.

Direito de locomoção

A relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, destacou inicialmente que a utilização do habeas corpus em matéria cível deve ser igualmente ou até mais excepcional do que no caso de matéria penal, já que é indispensável a presença de direta e imediata ofensa à liberdade de locomoção da pessoa.

Nesse sentido, e com base na jurisprudência do STJ e do Supremo Tribunal Federal, a ministra apontou que a questão relacionada à restrição do direito de ir e vir pela suspensão da CNH deve ser discutida pelas vias recursais próprias, não sendo possível a apreciação do pedido por meio de habeas corpus.

Por outro lado, no caso do bloqueio de passaporte, Nancy Andrighi explicou que a medida de restrição de saída do país sem prévia garantia da execução da dívida pode implicar – ainda que de forma potencial – ameaça ao direito de ir e vir, pois impede o devedor, durante o tempo em que a medida estiver vigente, de se locomover para onde quiser.

Princípio da cooperação

Admitida a possibilidade do questionamento da restrição de saída do país por meio do habeas corpus, a ministra lembrou que o princípio da cooperação, desdobramento do princípio da boa-fé processual, impõe às partes e ao juiz a busca da solução integral, harmônica e que resolva de forma plena o conflito de interesses.

Segundo a ministra, um exemplo do princípio da cooperação está no artigo 805 do CPC/2015, que impõe ao executado que alegue violação ao princípio da menor onerosidade a incumbência de apresentar proposta de meio executivo menos gravoso e mais eficaz ao pagamento da dívida.

Também expressos no CPC/2015, ressaltou a relatora, os princípios da atipicidade dos meios executivos e da prevalência do cumprimento voluntário, ainda que não espontâneo, permitem ao juiz adotar meios coercitivos indiretos – a exemplo da restrição de saída do país – sobre o executado para que ele, voluntariamente, satisfaça a obrigação de pagar a quantia devida.

Contraditório e fundamentação

Todavia, a exemplo do que ocorre na execução de alimentos, em respeito ao contraditório, a ministra apontou que somente após a manifestação do executado é que será possível a aplicação de medidas coercitivas indiretas, de modo a induzir ao cumprimento voluntário da obrigação, sendo necessário, ademais, a fundamentação específica que justifique a aplicação da medida constritiva na hipótese concreta.

No caso dos autos, Nancy Andrighi destacou que o juiz aplicou medidas coercitivas indiretas sem observar o contraditório prévio e sem motivação para a determinação de restrição à saída do país, o que seria suficiente para impedir a utilização desse meio de coerção. Entretanto, a ministra também lembrou que o devedor não propôs meio de menor onerosidade e de maior eficácia da execução, o que também representa violação aos deveres de boa-fé e colaboração.

“Como esse dever de boa-fé e de cooperação não foi atendido na hipótese concreta, não há manifesta ilegalidade ou abuso de poder a ser reconhecido pela via do habeas corpus, razão pela qual a ordem não pode ser concedida no ponto”, concluiu a ministra ao negar provimento ao recurso em habeas corpus.

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RHC 99606

Amor compartilhado: morando com pai e mãe depois da separação

Amor compartilhado

Mesmo antes da edição da lei que regulamentou a guarda compartilhada, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) já decidia em favor do convívio da criança com ambos os pais separados. O conceito surgiu no ordenamento jurídico nacional em 2008, com a Lei 11.698, e foi posteriormente aperfeiçoado pela edição da Lei 13.058/14.

Uma das posições adotadas pelo STJ é a ideia de que, na falta de acordo, mesmo havendo clima hostil entre os pais, o convívio da criança com ambos deve ser determinado pelo juiz – salvo quando comprovada no processo sua absoluta inviabilidade.

Não foi preciso tanto para Ceci do Espírito Santo e Pedro Henrique Garcia, um casal de Brasília cujo divórcio, em 2009, ocorreu de forma amigável. Desde o início houve disposição mútua para dividir o convívio e as responsabilidades com os filhos Diego e Rafael, hoje com 18 e 16 anos, respectivamente. Só não sabiam exatamente como isso poderia ser feito.

O regime de guarda precisaria ser homologado judicialmente, e a ideia de filhos morando um tempo aqui, outro ali, fazia lembrar o sistema de guarda alternada, caracterizado por períodos longos e repudiado pela jurisprudência.

Presença paterna

Quando decidiu pela separação, uma das maiores preocupações do casal era em relação à guarda dos filhos, que, à época, tinham nove e sete anos. A recente previsão legal de guarda compartilhada andava sujeita a muitas controvérsias e incertezas. Ceci e Pedro contam que, por razões culturais ainda referendadas pela Justiça, era muito forte a tendência de atribuir preferência às mães.

“Apesar desse forte aspecto, sempre tive consciência da importância da participação constante da figura paterna na vida das crianças, motivo pelo qual optamos por adotar um modelo que permitisse aos meninos conviver com os dois. A guarda compartilhada foi o que melhor se adequou a esse pensamento”,

explica Ceci.
No STJ, a ministra Nancy Andrighi foi relatora do processo em que se estabeleceram as principais balizas da jurisprudência sobre o assunto. Ela destacou a importância da mudança de paradigma para vencer

“a ideia reinante de que os filhos, de regra, deveriam ficar com a mãe, restringindo-se a participação dos pais a circunstâncias episódicas que, na prática, acabavam por desidratar a legítima e necessária atuação do cônjuge que não detinha a custódia física – normalmente o pai –, fazendo deste um mero coadjuvante na criação dos filhos”.

Pedro confirma que, à época, ouviu críticas e comentários desanimadores vindos de pessoas próximas:

“Confesso que cheguei a ficar com dúvidas sobre a efetividade da guarda compartilhada, afinal, era o futuro dos meus filhos que estava sendo decidido”.

Após nove anos, e com os meninos já praticamente criados, os resultados da experiência cuidaram de apagar qualquer sombra daquelas dúvidas iniciais.

Compreensão e flexibilidade

Ceci conta que, ao tempo do divórcio, a jurisprudência que se formava pesou muito para decidir como seria a guarda dos meninos. “O juiz se embasou em posicionamentos jurisprudenciais para fundamentar a decisão que determinou a guarda compartilhada”, lembra.

A rotina se estabeleceu da seguinte maneira: os filhos trocam de casa toda segunda-feira, e em ambas as residências cada um tem seu quarto. Na semana em que ficam na casa da mãe, o pai tenta estar presente de alguma maneira, para não passar muito tempo sem ver os filhos, e vice-versa.

“Na semana em que estão na casa do pai, eu costumo almoçar com eles no mínimo dois dias, ou, se a rotina estiver apertada, pelo menos buscá-los na escola e deixá-los em casa”,

detalha Ceci.

Nesses nove anos, muita coisa foi se ajustando. Segundo ela, o sucesso do modelo depende da compreensão e da flexibilidade dos envolvidos. Um exemplo foi quando, por descuido, marcou uma viagem com as crianças na data de comemoração do Dia dos Pais.

“O Pedro foi muito compreensivo e entendeu que o benefício da viagem para os meninos compensaria a ausência deles na data. A nosso ver, o bem-estar deles sempre vem primeiro”,

diz Ceci.

Esse é o entendimento do STJ, que prioriza o interesse da criança ao eleger a guarda compartilhada como o modelo mais benéfico para suas necessidades. A jurisprudência considera a alternância de lares uma decorrência lógica desse modelo.

Regras fundamentais

“A ausência de compartilhamento da custódia física esvazia o processo, dando à criança visão unilateral da vida, dos valores aplicáveis, das regras de conduta e todas as demais facetas do aprendizado social”,

afirmou a ministra Nancy Andrighi, para quem a alternância de lares é a efetiva expressão da guarda compartilhada.

Pedro credita a efetividade do modelo a um fator que depende do esforço mútuo dos pais: as regras das casas. “Decidimos que adotaríamos as mesmas regras para ambas as casas, principalmente para fatores como horário de dormir e alimentação. Nosso objetivo era evitar que eles tomassem partido por aquela casa que possuísse regras eventualmente mais favoráveis a seus interesses de criança, como onde poderiam comer mais guloseimas ou onde não houvesse horários determinados para a realização de tarefas escolares.”

Hoje, Diego e Rafael já estão com o pé na porta de entrada de sua vida adulta. Daqui para a frente, caberá a eles decidir onde vão morar. Ao que tudo indica, a opção será por continuar aproveitando o amor que tanto o lar da mãe quanto o do pai têm a oferecer.

Família será indenizada por má prestação de serviços médicos

má prestação de serviços médicos
A 2ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo condenou hospital, operadora de planos de saúde e uma médica por má prestação de serviços médico-hospitalares. Eles terão que pagar à mãe de uma criança, que sofreu lesão neurológica irreversível por falha no atendimento logo após seu nascimento, R$ 281,1 mil a título de danos morais, além de pensão alimentícia vitalícia no valor equivalente a dois salários mínimos.

De acordo com os autos, a equipe de enfermagem, ao realizar atendimento de rotina após o parto, notou que a menina apresentava quadro de icterícia e, por esse motivo, avisou a médica pediatra, que prestou atendimento somente quatro horas depois. A demora resultou no agravamento do estado de saúde, que evoluiu para quadro conhecido por “Doença de Kernicterus”, que provoca lesão neurológica permanente.

Ao julgar o recurso, a desembargadora Marcia Regina Dalla Déa Barone afirmou que os fatos proporcionaram à mãe danos capazes de causar intenso sofrimento, o que impõe o dever de indenizar. “Com efeito, o quadro clínico para o qual a autora evoluiu, consistente em lesão neurológica de caráter irreversível, o que ocasionou atraso no desenvolvimento psicomotor, ausência de fala, dependência de terceiros para atos da vida cotidiana e ausência de autonomia para a prática de atos triviais, causada por erro médico o qual poderia ter sido evitado, à evidência causou danos psicológicos na autora, que devem ser indenizados e dispensam comprovação, cuidando-se de hipótese em que configurados os danos morais in re ipsa.”

O julgamento, unânime, teve a participação dos desembargadores Rosangela Maria Telles e José Carlos Ferreira Alves.

Apelação nº 0009011-92.2011.8.26.0220

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