Os problemas legais que você pode ter como cuidador.

cuidador de idosos curatela
[vc_row][vc_column][vc_column_text]Na pandemia, algumas questões têm sido trazidas com mais frequência à tona. Por exemplo, aumentou o número de pessoas que perderam a capacidade de cuidarem dos próprios interesses, o que leva à necessária intervenção de parentes próximos. Às vezes, isso é feito por meio da ação de interdição.

O que é a interdição? Trata-se de procedimento judicial, no qual o juiz confere a alguém – o chamado “curador” – poderes para representar a pessoa incapacitada – o “curatelado”. A lei prevê que, no curso do processo, o curatelado passe por avaliação médica, normalmente feita por um psiquiatra. Todo o procedimento é acompanhado pelo Ministério Público.

Uma vez nomeado, o curador normalmente passa a administrar o patrimônio do curatelado. Aí, chegamos ao ponto que queremos abordar neste pequeno artigo: o que nem todos sabem é que, como consequência legal de sua nomeação, o curador assume a obrigação de prestar contas de sua gestão.

Os cuidados do cuidador de idosos e a curatela

Em outras palavras: com a periodicidade definida pelo juiz (normalmente, a cada ano), o curador deve apresentar, em juízo, uma relação das receitas e despesas vinculadas ao curatelado, comprovando tudo isso com a juntada dos respectivos documentos.

Se não o fizer, pode ser afastado da função e ser responsabilizado pelos prejuízos que vierem a ser apurados. Exemplo: se, ao gastar recursos do curatelado, o curador não conseguir demonstrar que o fez em benefício do incapaz, haverá de restituir os valores em questão!

Só que, na prática, é comum os curadores fazerem gastos em prol dos curatelados e, por displicência ou desinformação, não terem os documentos comprobatórios disto. Às vezes, até se preocupam em guardar documentos, mas não sabem obter os que são corretos!

Recentemente, recebemos um caso assim no escritório. É lamentável ver que, além de desempenharem o papel de cuidarem de seus queridos, os curadores mal orientados ainda correm o risco de passarem por “desonestos” e terem de restituir valores dos quais não se beneficiaram…

A prestação de contas acima referida, além de exigir a apresentação de documentos específicos, segue parâmetros próprios, nem sempre conhecidos pelo contador, por mais apto que seja.

Caso você tenha se identificado com o relato acima, não demore a procurar o auxílio de profissional especializado em direito de família, e, de preferência, com experiência no assunto (prestação de contas no exercício de curatela). Não é porque cuida do outro que o curador pode descuidar de si próprio!

(Não deixe de acessar o canal “FRK Explica, no YouTube. Disponibilizamos conteúdo variado e em linguagem acessível.)[/vc_column_text][/vc_column][/vc_row]

Inventário: apesar da dor do luto, não perca o prazo do processo

Inventário: apesar da dor do luto, não perca o prazo do processo

A lei prevê que o falecimento de alguém gera a transmissão de seu patrimônio aos herdeiros. Essa transmissão se dá por meio de um procedimento com formato específico, o chamado “inventário”. Em termos simples, o inventário consiste em se qualificar o falecido, indicando seus bens, dívidas e herdeiros; definir a divisão dos bens (partilha) e recolher o imposto incidente (ITCMD – Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doações), que é estadual. Como o tema é complexo, neste artigo abordarei apenas alguns de seus aspectos.

O inventário pode ser judicial (via processo na justiça) ou extrajudicial (feito perante um cartório, por meio de escritura pública). Quando será cabível um ou outro procedimento?

O inventário judicial é sempre uma possibilidade, ou seja, todo inventário pode ser processado por essa via. Porém, se comparado ao extrajudicial, tende a ser muito mais demorado e, portanto, custoso. Assim, sempre vale a pena analisar a alternativa de fazer o inventário pela via extrajudicial.

Para ter acesso ao inventário extrajudicial, é necessário que todos os envolvidos sejam: capazes (maiores de idade e em pleno gozo de suas faculdades mentais) e concordes com a forma de divisão dos bens, ou seja, não pode haver conflito a respeito do que fica com quem. Caso o falecido tenha deixado testamento, é necessário providenciar pequeno procedimento judicial de “abertura e registro” do testamento, para então seguir com o procedimento extrajudicial.

O que muita gente não sabe é que há prazo improrrogável de 60 (sessenta) dias para abrir o procedimento de inventário. Pois é: a dor de ter perdido um ente querido, o luto subjacente, de maneira alguma poupam os envolvidos, devendo eles cumprir o prazo estabelecido pela lei, sob pena de terem de recolher o ITCMD com multa e juros. Mas não é só: no Estado de São Paulo, não basta iniciar o inventário em 60 dias. A lei também prevê prazo de 180 dias para sua finalização, sob pena de o imposto devido sofrer acréscimos. Por isso, pode acontecer de os interessados perderem os referidos prazos, absorvidos pela dor da perda de um ente querido.

Normalmente, há muitos detalhes a observar, a começar pelo teor da própria certidão de óbito. Erros que venham a ser cometidos nas declarações nela inseridas podem levar à necessidade de reparação do documento, o que demanda tempo, com possível prejuízo para a abertura do inventário.

Não se perca de vista, ainda, que tanto no inventário judicial quanto no extrajudicial os interessados deverão contar com a assessoria de advogado. Aliás, a obrigatoriedade da presença deste profissional é prevista em lei, dada a complexidade relativa à parte documental e às possibilidades envolvendo a divisão de bens.

Neste aspecto, contar com o auxílio de um advogado especializado no assunto é ter a seu lado, além da imprescindível orientação técnica, também um bom conselheiro. Num momento de dor e, eventualmente, de potencial conflito em família, isso não é algo que se possa desprezar… Ignorá-lo pode significar danos significativos, e não só de natureza material.

Como disse no início, o tema é bastante complexo. Por isso, prometo retornar a ele.

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Quarta Turma admite flexibilizar diferença mínima de idade na adoção

Quarta Turma admite flexibilizar diferença mínima de idade na adoção

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu que é possível, dependendo das circunstâncias de cada caso, flexibilizar a exigência de diferença mínima de 16 anos entre adotando e adotante, prevista no parágrafo 3º do artigo 42 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

O entendimento está afinado com precedente no qual a Terceira Turma, acompanhando o voto do relator, ministro Villas Bôas Cueva, concluiu que o limite mínimo de idade entre as partes envolvidas no processo de adoção é uma referência a ser observada, mas não impede interpretações à luz do princípio da socioafetividade, cabendo ao juiz analisar as particularidades de cada processo.

Como se fosse filha

O caso analisado teve origem em ação ajuizada por um padrasto em 2017, com a finalidade de obter adoção unilateral de sua enteada. O autor alegou que, apesar de não cumprir o requisito da diferença mínima de idade prevista no ECA – ele nasceu em 1980 e a enteada, em 1992 –, todas as outras exigências legais estão plenamente satisfeitas.

O padrasto informou que convivia em união estável com a mãe da enteada desde 2006 e que se casaram em 2015. Relatou que, desde o início da convivência familiar – época em que a menina tinha 13 anos –, assumiu a responsabilidade e os cuidados com ela, como se fosse sua filha. Por último, sustentou que a adotanda não tem vínculo afetivo com o pai biológico e que a adoção lhe traria vantagens.

O pedido de adoção foi julgado improcedente pelo juiz de primeiro grau, por considerar que o requisito de diferença mínima de idade não pode ser mitigado. A decisão foi mantida na segunda instância.

Cunho biológico

Em seu voto, o relator do recurso no STJ, ministro Luis Felipe Salomão, lembrou inicialmente que se trata de um caso de adoção unilateral, em que o padrasto ou a madrasta pode adotar o enteado se for demonstrada a existência de vínculo socioafetivo revelador de relação parental estável, pública, contínua e duradoura.

Salomão destacou que a exigência de diferença mínima de idade existe para que a adoção confira cunho biológico à família que está sendo constituída.

“A diferença de idade na adoção tem por escopo, principalmente, assegurar a semelhança com a filiação biológica, viabilizando o pleno desenvolvimento do afeto estritamente maternal ou paternal e, de outro lado, dificultando a utilização do instituto para motivos escusos, a exemplo da dissimulação de interesse sexual por menor de idade”,

declarou.

Sem prejuízo

O relator ressaltou que o conteúdo dos autos não indica o objetivo de formação de uma “família artificial”, com desvirtuamento da ordem natural das coisas.

“Apesar de o adotante ser apenas 12 anos mais velho que a adotanda, verifica-se que a hipótese não corresponde a pedido de adoção anterior à consolidação de uma relação paterno-filial – o que, em linha de princípio, justificaria a observância rigorosa do requisito legal”,

disse o ministro.

Para Salomão, não se percebe no caso situação jurídica capaz de causar prejuízo à adotanda, que, assim como sua mãe biológica, está de acordo com a adoção, no

“intuito de tornar oficial a filiação baseada no afeto emanado da convivência familiar estável e qualificada”.

“Uma vez concebido o afeto como elemento relevante para o estabelecimento da parentalidade, e dadas as peculiaridades do caso concreto, creio que o pedido de adoção deduzido pelo padrasto – com o consentimento da adotanda e de sua mãe biológica (atualmente, esposa do autor) – não poderia ter sido indeferido sem a devida instrução probatória (voltada para a demonstração da existência ou não de relação paterno-filial socioafetiva no caso) “,

concluiu.

Acompanhando o voto do relator, a Quarta Turma determinou que o processo volte à primeira instância para que o juiz prossiga com a instrução do caso, ouvido o pai biológico.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Companheira recebe direito à pensão de previdência privada mesmo sem ter sido indicada pelo titular

Companheira recebe direito à pensão de previdência privada mesmo sem ter sido indicada pelo titular

A 36ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve decisão que condenou operadora de previdência privada a pagar suplementação de pensão à companheira de segurado morto em 2016, mesmo sem ela estar entre os beneficiários indicados no contrato. A turma julgadora entendeu, por unanimidade, que a união estável e a consequente condição de dependente do segurado dá a ela direito ao benefício.

O processo foi ajuizado pela companheira do segurado, com quem viveu em união estável de 2002 a 2016, ano da morte dele. O fundo de pensão negou o direito ao benefício sob a alegação de que ela não havia sido indicada pelo companheiro como sua beneficiária – a adesão foi feita em 1976, quando eles ainda não haviam iniciado a relação. Porém, o regulamento do contrato garante que em caso “de falecimento de participante que não tenha declarado em vida nenhum beneficiário, o benefício será devido ao grupo de beneficiários habilitados pela Previdência Social”, condição da autora por conta do reconhecimento da união estável.
O relator da apelação, desembargador Arantes Theodoro, afirmou que

“a autora não foi nomeada beneficiária quando da adesão do participante ao plano, nem posteriormente, mas era companheira dele e como tal foi reconhecida pela Previdência Social, não concorrendo com outro dependente. Logo, ante a textual previsão do § 7º do artigo 5º do Regulamento, a autora fazia jus ao benefício de previdência privada, exatamente como concluiu o sentenciante, sem necessidade de recomposição das contribuições ou de redução proporcional do valor do benefício”.

Os desembargadores Walter Exner e Pedro Baccarat completaram o julgamento.

Apelação nº 1020622- 93.2018.8.26.0506

Colação de terreno doado em inventário deve considerar valor certo, e não proveito econômico dos herdeiros

Colação de terreno doado em inventário deve considerar

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) para estabelecer, como método adequado de quantificação de uma doação feita a parte dos herdeiros, o valor certo correspondente à venda de um terreno pelo falecido e sua esposa, cujo crédito foi doado aos filhos e posteriormente quitado por meio da outorga de alguns imóveis erguidos no terreno por uma construtora.

O TJRS havia adotado como critério de cálculo o proveito econômico relativo à outorga dos bens aos herdeiros. Entretanto, a Terceira Turma considerou que o artigo 1.792 do Código Civil de 1916 prevê, para definição do valor de bens doados, o critério objetivo do valor certo ou estimado do bem – no caso dos autos, o crédito pela venda do terreno.

“Esse, pois, é o valor a ser considerado para o fim da colação e de igualação das legítimas, não se prestando para essa finalidade o proveito ou o benefício econômico representado pelos bens imóveis (dois apartamentos e três boxes) que foram posteriormente escriturados em favor dos donatários como forma de pagamento do crédito que receberam como doação do autor da herança”,

afirmou a relatora do recurso especial, ministra Nancy Andrighi.
De acordo com os autos, em 1995, o autor da herança e sua esposa venderam um terreno para uma construtora pelo valor de R$ 100 mil. Em 1996, eles cederam o crédito pela venda aos únicos herdeiros nascidos à época da celebração do negócio. Mais tarde, em 2000, como forma de quitação do crédito, a construtora outorgou aos herdeiros escritura sobre dois apartamentos e três boxes erguidos no terreno objeto da venda. O pai dos herdeiros faleceu em 2001.

Na ação de inventário, o juiz determinou, para fins de partilha, que a colação deveria se dar pelo valor dos imóveis construídos no terreno vendido, e não pelo valor do crédito recebido pelo falecido no momento da venda. A decisão foi mantida pelo TJRS.

Salva guarda

A ministra Nancy Andrighi disse que a finalidade da colação é igualar as legítimas, sendo obrigatório para os descendentes sucessivos trazer à conferência o bem objeto de doação do ascendente comum, tendo em vista que, nessas hipóteses, há a presunção de adiantamento da herança.

“Conclui-se, desse modo, que a razão de existir desse instituto está intimamente associada à impossibilidade de se colocar um dos herdeiros em posição de desvantagem em relação aos demais, salvaguardando o direito concedido a todos de tocar parcelas iguais da legítima deixada pelo autor da herança”,

disse a ministra.

Nesse sentido, a ministra explicou que o artigo 1.792 do Código Civil de 1976 (que corresponde ao artigo 2.004 do código de 2002) estabelece, como critério para igualar a legítima, o valor certo ou estimado do bem, não havendo referência ao proveito ou benefício econômico que esse bem eventualmente tenha trazido ao donatário.

Critério objetivo

Segundo Nancy Andrighi, a escolha se justifica pela necessidade de instituir um critério objetivo que não sofra influência de elementos externos de natureza econômica, temporal ou mercadológica, “que, se porventura existentes, deverão ser experimentados exclusivamente pelo donatário, não impactando o acertamento igualitário da legítima”.

Essa é a razão pela qual o parágrafo 2º dos dispositivos nos dois códigos

“excluem da colação as benfeitorias acrescidas, os rendimentos, os lucros, os danos e as perdas relacionadas ao bem doado, aplicando-se o mesmo raciocínio aos proveitos ou benefícios econômicos eventualmente trazidos ao donatário”,

concluiu a ministra ao reformar a decisão do TJRS.

Leia o acórdão

REsp1713098

Corpo de brasileiro permanecerá congelado nos Estados Unidos, decide Terceira Turma

Corpo de brasileiro

Em julgamento inédito no Superior Tribunal de Justiça (STJ), realizado nesta terça-feira (26), a Terceira Turma reconheceu o direito de preservação do corpo de um brasileiro em procedimento de criogenia, nos Estados Unidos. A criogenia é a técnica de preservação do cadáver congelado em temperaturas extremamente baixas, na esperança de que ele possa ser ressuscitado no futuro.De forma unânime, o colegiado considerou que a legislação brasileira, apesar de não prever a criogenia como forma de destinação do corpo, também não impede a realização do procedimento. Além disso, a turma levou em consideração a própria manifestação de vontade do falecido, transmitida à sua filha mais próxima, que conviveu com ele por mais de 30 anos.

“Na falta de manifestação expressa deixada pelo indivíduo em vida acerca da destinação de seu corpo após a morte, presume-se que sua vontade seja aquela apresentada por seus familiares mais próximos”,

apontou o relator do recurso, ministro Marco Aurélio Bellizze.
Na ação que gerou o recurso no STJ, duas filhas do primeiro casamento contestavam a decisão de sua irmã paterna, filha do segundo casamento, de submeter o corpo do pai, falecido em 2012, ao congelamento no Instituto de Criogenia de Michigan, nos Estados Unidos. Para as autoras da ação, o corpo do pai deveria ser sepultado no Rio Grande do Sul, ao lado de sua ex-esposa.

Em primeira instância, o juiz julgou procedente o pedido das irmãs e autorizou o sepultamento do corpo. No primeiro julgamento da apelação, ainda em 2012, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) reformou a sentença e determinou a continuação do procedimento de criogenia. Após essa decisão, a filha do segundo casamento encaminhou o corpo ao exterior.

No entanto, em análise de embargos infringentes, o próprio TJRJ restabeleceu a sentença, sob o fundamento de que, em virtude da ausência de autorização expressa deixada pelo pai em vida, não seria razoável permitir o congelamento pela vontade de uma de suas filhas.

Liberdade de escolha

O ministro Marco Aurélio Bellizze destacou inicialmente que a questão analisada no recurso não diz respeito aos efeitos da criogenia sobre o corpo, ou seja, se os avanços da ciência permitirão que ele retorne à vida algum dia, como prometem os defensores dessa técnica. O ponto central em discussão, apontou, é se seria possível reconhecer que o desejo do falecido era o de ser criopreservado após a morte, bem como se a sua vontade afrontaria o ordenamento jurídico brasileiro.

O ministro destacou que, na ausência de previsão legal sobre a criogenia pós-morte, o artigo 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro prevê que o juiz deve decidir de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.

Aplicando a analogia jurídica, Bellizze apontou que a legislação brasileira, além de proteger as manifestações de vontade do indivíduo, contempla formas distintas de destinação do corpo humano após a morte, além do sepultamento tradicional, como a cremação, a doação de órgãos para transplante, a entrega para fins científicos, entre outras.

“Nota-se, portanto, que o ordenamento jurídico confere certa margem de liberdade à pessoa para dispor sobre seu patrimônio jurídico após a morte, assim como protege essa vontade e assegura que seja observada. Demais disso, as previsões legais admitindo a cremação e a destinação do cadáver para fins científicos apontam que as disposições acerca do próprio corpo estão incluídas nesse espaço de autonomia. Trata-se do direito ao cadáver”,

declarou o ministro.

Respeito ao corpo

De acordo com o relator, além de não haver norma que proíba a submissão de corpos à criogenia, não há ofensa à moral ou aos bons costumes, já que não há a transformação do corpo em uma espécie de “patrimônio”. De igual forma, não há exposição pública do cadáver – o que seria incompatível com as normas sanitárias e de saúde pública. Além disso, ressaltou, o procedimento é realizado com respeito aos restos mortais, pois o corpo é acondicionado em local preservado sem impedir a visitação pelos entes queridos.

Em relação à manifestação de vontade do falecido, Bellizze afirmou que, ao contrário da conclusão do TJRJ, a legislação brasileira não exige formalidade específica para confirmar a expressão de última vontade, podendo ser presumida pela manifestação de seus familiares mais próximos.

No caso dos autos, o ministro disse que, a despeito de as partes em litígio terem o mesmo grau de parentesco em relação ao falecido, a filha responsável pelo procedimento de criogenia conviveu com ele por mais de 30 anos e, portanto, é a pessoa que melhor poderia revelar seus desejos e convicções. Por outro lado, acrescentou o relator, as irmãs não demonstraram convivência próxima com o pai, e o pedido de sepultamento revelou ser um desejo delas próprias, não do falecido.

Além de considerar a vontade do falecido, o ministro Bellizze lembrou que o corpo já se encontra congelado desde 2012, o que implica certa consolidação da situação no tempo, motivo também levado em conta pelo colegiado para a permanência do corpo do brasileiro no instituto de criogenia americano.

REsp 1693718

Todos os herdeiros legítimos fazem jus à partilha igualitária de cota testamentária que retorna ao monte por ausência do direito de acrescer

Todos os herdeiros legítimos fazem jus à partilha igualitária

Nas hipóteses de testamento que fixa cotas determinadas para divisão da herança, e em caso de um dos herdeiros testamentários morrer antes da abertura da sucessão (a chamada “pré-morte”), o valor da cota-parte remanescente deverá ser redistribuído entre todos os herdeiros legítimos, conforme a ordem legal de preferência estabelecida no Código Civil, não havendo impedimento legal para que herdeiros testamentários participem também como herdeiros legítimos na mesma sucessão hereditária.

Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso do irmão da testadora, que tentava excluir seus sobrinhos da partilha da cota remanescente alegando que, por serem herdeiros testamentários, não poderiam figurar novamente na sucessão na condição de herdeiros legítimos.

No caso analisado, a testadora faleceu solteira e sem herdeiros necessários (pais ou filhos), motivo pelo qual dispôs integralmente de seu patrimônio por meio de testamento público. No testamento ela contemplou, igualmente, dez sobrinhos.

Segundo o ministro Villas Bôas Cueva, relator, a testadora afastou da sucessão o herdeiro colateral, seu irmão, recorrente no STJ. A questão a ser analisada é o que ocorre com a quantia destinada a um dos sobrinhos que faleceu antes da morte da testadora.

Cota remanescente

As instâncias ordinárias entenderam que a partilha da cota remanescente dos bens testados deveria ser feita de forma igualitária entre todos os herdeiros, incluindo novamente os sobrinhos filhos dos irmãos falecidos, que, além de serem herdeiros testamentários, ingressam na sucessão na condição de herdeiros legítimos.

O ministro lembrou que os sobrinhos da testadora, além de serem herdeiros testamentários, são também herdeiros por estirpe, visto que receberão a cota-parte da herança que cabia à falecida mãe ou pai, herdeiros legítimos, por representação.

“Na hipótese de quinhões determinados, não há falar no direito de acrescer. Se o herdeiro testamentário pleiteado com cota fixa falecer antes da abertura da sucessão, sem previsão de substituto, aquela parcela deve retornar ao monte e ser objeto de partilha com todos os herdeiros legítimos”,

disse o relator.
É inviável, de acordo com o relator, acolher a tese do recorrente de que ele seria o único herdeiro legítimo na linha colateral, tendo direito ao montante integral deixado pelo herdeiro testamentário falecido.

Entendimento correto

Segundo Villas Bôas Cueva, foi correta a conclusão do tribunal de origem no sentido de que o recorrente e os demais representantes dos irmãos da testadora, por serem os herdeiros legítimos na linha colateral, fazem jus a um décimo dos bens, em decorrência de não se realizar o direito de acrescer.

“O direito de acrescer previsto no artigo 1.941 do Código Civil de 2002 representa uma forma de vocação sucessória indireta e pressupõe (i) a nomeação dos herdeiros na mesma cláusula testamentária; (ii) que o patrimônio compreenda os mesmos bens ou a mesma porção de bens e (iii) a inexistência de cotas hereditárias predeterminadas”,

explicou.

O ministro ratificou o entendimento do Ministério Público, que enfatizou a inexistência do direito de acrescer entre os demais herdeiros nos casos em que o testador fixe a cota de cada sucessor.

Nessas hipóteses, segundo parecer do MP e a conclusão do colegiado, quando há determinação da cota de cada herdeiro, e não correspondendo estas ao total da herança, o que remanescer pertencerá aos herdeiros legítimos, obedecendo à ordem exposta no artigo 1.829 do Código Civil.

Leia o acórdão

REsp 1674162

Tribunal paulista afasta multa em inventários extrajudiciais

multa em inventários extrajudiciais

Os herdeiros que optaram pelo inventário extrajudicial não estão sujeitos à multa de 10% de ITCMD, estabelecida pelo Estado de São Paulo, se não declararem o tributo devido na transmissão de bens em até 60 dias, contados da data da morte. O entendimento é do Tribunal de Justiça (TJ-SP). Para os desembargadores, basta a nomeação do inventariante no período para evitar a penalidade.

O prazo de 60 dias para a instauração de inventário está previsto no artigo 611 do Código de Processo Civil (CPC). Em São Paulo, porém, a Fazenda cobra multa de 10% sobre o valor do imposto em caso de descumprimento, segundo o artigo 21, inciso I da Lei nº 10.705, de 2000. Após a apuração dos bens, deve-se pagar 4% de ITCMD ao Estado.

Nos casos em que a família decide pelo inventário judicial, a abertura é feita por meio da apresentação da certidão de óbito ou do testamento em juízo. O problema ocorre com o processo extrajudicial que, por ser mais simples, não exige protocolo de petição para abertura do inventário.

O inventário extrajudicial foi previsto pela Lei nº 11.441, de 2007, como uma solução mais prática, rápida e barata. Ele só é permitido quando não há litígio entre herdeiros, não há menores envolvidos ou nos casos em que existem testamentos.

Em 2016, a Corregedoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo emitiu o Provimento CGJ nº 55, para considerar a nomeação de inventariante como termo inicial do inventário extrajudicial. Porém, a Secretaria de Fazenda do Estado de São Paulo tem desconsiderado esse provimento e determinado que, para se isentar da multa de 10%, é necessário que a declaração eletrônica de ITCMD seja transmitida dentro dos 60 dias após a morte.
Essa exigência, segundo o advogado Bruno Sigaud, do Sigaud Marins & Faiwichow,

“além de ser absolutamente ilegal e descabida, faz com que os herdeiros corram indevidamente para calcular o ITCMD e transmiti-lo dentro dos 60 dias”.

Em alguns casos, em razão da quantidade de bens, não conseguem cumprir o prazo e pagam a multa.
Em um processo julgado recentemente, a 12ª Câmara de Direito Público do TJ-SP manteve sentença (processo nº 1036194-38.2017.8.26.0114) que garantiu a uma inventariante o direito de emitir a guia de recolhimento de ITCMD sem a incidência da multa de 10% por suposto atraso na abertura do inventário extrajudicial. A decisão foi unânime.

De acordo com o voto do relator, desembargador Ribeiro de Paula, a abertura do inventário judicial se dá com o requerimento, instruído apenas com a certidão de óbito do autor da herança. Já no extrajudicial, o procedimento é único com a lavratura da escritura, do inventário e partilha.

“Assim, exigir dos optantes pela via extrajudicial o cálculo e recolhimento do ITCMD na data de lavratura da escritura do inventário violaria o princípio da isonomia, em comparação aos optantes pela via judicial”,

diz o desembargador em seu voto.

Para superar esse tratamento desigual, segundo ele, foi publicado o Parecer nº 195, de 2016, que equiparou a lavratura da escritura de nomeação do inventariante, no inventário extrajudicial, ao requerimento de inventário judicial. Esse parecer, deu origem ao Provimento nº 55, de 2016, de mesmo teor.

No caso dos autos, como o óbito ocorreu no dia 2 de fevereiro de 2017 e a lavratura da escritura de nomeação da inventariante em 31 de março de 2017, 57 dias da abertura da sucessão, não se aplicaria a multa, de acordo com o desembargador paulista.

Na decisão, ele cita outros precedentes do tribunal paulista. Um deles da 7ª Câmara de Direito Público (apelação nº 1013 194-95.2017.8.26.0053) e outro da 11ª Câmara de Direito Público (apelação nº 1009865-75. 2017.8.26.0053).

A jurisprudência do tribunal paulista, segundo o advogado Bruno Sigaud, tem se consolidado no sentido de afastar a aplicação da multa. Ele diz que tem sido aceita a alegação de que a escritura pública de inventariante seria o termo inicial para a abertura do inventário extrajudicial. Apesar disso, a Fazenda do Estado de São Paulo segundo o advogado, continua a não aplicar o Provimento nº 55 da Corregedoria Geral de Justiça, o que tem resultado em novas ações judiciais.

O advogado Leo Lopes, sócio do FAS Advogados, afirma que todas as decisões encontradas no TJ-SP excluem essa multa quando em 60 dias há a nomeação do inventariante. Segundo Lopes, há uma sequência de procedimentos que devem ser adotados, como a pesquisa para saber se há testamento, a descoberta de quem são os herdeiros, quais são os bens e as dívidas, para depois ser feito o cálculo do ITCMD devido. “Esse prazo de 60 dias seria muito exíguo. Até porque ainda há o luto da família.”

Procurada pelo Valor, a Procuradoria Geral do Estado (PGE) de São Paulo não deu retorno até o fechamento da edição.

 

Direito real de habitação de cônjuge sobrevivente não depende da inexistência de outros bens no patrimônio próprio

Direito real de habitação de cônjuge

O direito real de habitação do cônjuge sobrevivente no imóvel do casal, bem como nos termos do artigo 1.831 do Código Civil, é garantido independentemente de ele possuir outros bens em seu patrimônio pessoal.Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento a um recurso que questionava o direito com a justificativa de que o cônjuge dispõe de outros imóveis.

Para o ministro Villas Bôas Cueva, relator do caso no STJ, a única condição que o legislador impôs para assegurar ao cônjuge sobrevivente o direito real de habitação é que o imóvel destinado à residência do casal fosse o único daquela natureza a inventariar.

“Nenhum dos mencionados dispositivos legais impõe como requisito para o reconhecimento do direito real de habitação a inexistência de outros bens, seja de que natureza for, no patrimônio próprio do cônjuge sobrevivente”,

fundamentou.

Exigência controvertida

O relator citou entendimento da Quarta Turma do tribunal no sentido de que o direito real de habitação é conferido em lei independentemente de o cônjuge ou companheiro sobrevivente ser proprietário de outros imóveis.

Villas Bôas Cueva destacou que a parte final do artigo 1.831 faz referência à necessidade de que o imóvel seja “o único daquela natureza a inventariar”, mas mesmo essa exigência não é interpretada de forma literal pela jurisprudência.

“Nota-se que até mesmo essa exigência legal – inexistência de outros bens imóveis residenciais no acervo hereditário – é amplamente controvertida em sede doutrinária. Daí porque esta corte, em pelo menos uma oportunidade, já afastou a literalidade de tal regra”,

disse ele.

Vínculo afetivo

O objetivo da lei, segundo o ministro, é permitir que o cônjuge sobrevivente permaneça no mesmo imóvel familiar em que residia ao tempo da abertura da sucessão, como forma de concretizar o direito à moradia e também por razões de ordem humanitária e social, “já que não se pode negar a existência de vínculo afetivo e psicológico estabelecido pelos cônjuges com o imóvel em que, no transcurso de sua convivência, constituíram não somente residência, mas um lar”.

O relator afirmou que a legislação protege interesses mínimos de quem vive momento de “inconteste abalo” resultante da morte do cônjuge ou companheiro.

Leia o acórdão.

REsp 1582178

 

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