Alienação fiduciária de imóvel locado e destinado a ponto comercial

Alienação fiduciária de imóvel locado

A proteção do ponto comercial quando o locador deixa pagar parcelas do imóvel em  financiamento garantido com alienação fiduciária

PONTO COMERCIAL

A depender da atividade do empresário e da clientela que o reconhece pelo endereço, o local onde se fixa acaba se tornando em um elemento essencial para o seu desempenho e impacta no sobrevalor do estabelecimento empresarial (fundo de comércio/aviamento).

Em síntese, ponto comercial é um dos bens incorpóreos que geram sobrevalor e integram o estabelecimento empresarial e é o local onde este se situa.

Quando o empresário é dono do imóvel em que funciona o ponto comercial, este é protegido pelo direito de propriedade. Contudo, tratando-se de imóvel locado, a proteção ao ponto comercial decorre de determinadas normas e entendimentos que serão abordados ao longo deste artigo.

ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE IMÓVEL

Por seu turno, a alienação fiduciária é um tipo de garantia real que surgiu para diminuir os riscos dos credores que incrementam crédito no mercado.

A alienação fiduciária, em geral, trata-se de contrato acessório daquele que lhe serve de base (como de mútuo, compra e venda, e outros) e pelo qual o devedor fiduciante transfere ao credor fiduciário a propriedade resolúvel e a posse indireta de um bem em garantia de dívida contraída.

A qualidade resolúvel da propriedade perdura até que todas as prestações assumidas na alienação fiduciária estejam pagas. Assim, com o pagamento integral do preço resolve-se a propriedade plena do imóvel a favor do devedor fiduciante, o qual deverá apresentar termo de quitação fornecido pelo credor fiduciário para que o competente Oficial de Registro de Imóveis cancele a garantia fiduciária.

No entanto, com o inadimplemento do fiduciante a posse dele antes considerada justa passa a ser injusta, podendo o credor fiduciário demandar seu crédito pelas vias legais, inclusive consolidando a propriedade do imóvel em seu nome e a partir daí, no prazo de trinta dias, promover o leilão público para sua venda.

Consolidada a propriedade do imóvel, caberá ao fiduciário e ao arrematante: a) a competente ação de imissão na posse; ou b) a denúncia no prazo de noventa dias de eventual locação que tenha como objeto o imóvel garantido e consecutivamente a competente ação de despejo, caso não haja desocupação voluntária no prazo de trinta dias, contados da notificação.

E é a partir disso que surge o problema para aquele empresário que locou imóvel, onde fixou e disseminou seu ponto comercial, e veio a ser noticiado sobre a possibilidade de ter que dele se retirar porque o locador, enquanto fiduciante, deixou de adimplir com o financiamento do imóvel e o fiduciário ou arrematante não mais deseja manter a locação, denunciando-a.

Neste caso, pode o empresário locatário se opor à denúncia do contrato de locação?

CAUTELAS PARA SE EVITAR RISCO DE PERDA DO PONTO COMERCIAL

Antes de mais, é primordial que as partes cumpram os requisitos descritos na Lei do Inquilinato para que o contrato de locação de imóvel tenha plena validade contra eventuais adquirentes, a saber (artigo 8º):

a) o contrato deve viger por prazo determinado;
b) deve conter cláusula de vigência em caso de alienação; e,
c) deve estar averbado na matrícula do imóvel.

Atendidos tais requisitos, em o locador vendendo o imóvel ou o alienando fiduciariamente em garantia de dívida, a relação locatícia estará protegida, pois entende-se que quem o adquiriu, não importa a que título, teve ciência e aceitou os termos e prazos estipulados no contrato de locação.

Portanto, ao empresário que aluga imóvel para nele fixar o seu ponto comercial se recomenda fortemente que tome as devidas cautelas, a fim de não correr o risco de sofrer prejuízos imensuráveis com a perda de seu ponto diante de eventual denúncia do contrato de locação, seja por parte do credor fiduciário, o qual assistido pela Lei que institui a alienação fiduciária de coisa imóvel, seja por parte dos adquirentes/arrematantes, os quais assistidos pela Lei do Inquilinato.

Agora, pensemos que o empresário deseja locar imóvel que já seja objeto de alienação fiduciária em garantia. O ideal é que a locação não ocorra ou que ela ocorra observando-se os requisitos já citados e mais algum outro?

Pois bem, na contratação ou prorrogação de locação de imóvel que já seja objeto de alienação fiduciária em garantia, por prazo superior a um ano, deve ser obtida, para fins de vinculação aos seus termos e prazos, a expressa concordância do credor fiduciário.

Porém, caso o fiduciante, em sua plena liberdade de locar o imóvel, o faça ou a prorrogue por prazo superior a um ano sem a expressa concordância do já existente credor fiduciário, a locação do imóvel cuja propriedade houver se consolidado na pessoa deste poderá ser denunciada com prazo de trinta dias para desocupação. Mas atenção:

O fiduciário não poderá denunciar a locação se do contrato de alienação fiduciária não houver cláusula contratual específica sobre a denúncia de eventual locação ou se o fiduciário deixar de denunciar a locação no prazo legal de noventa dias, contados da consolidação da propriedade no Oficial de Registro de Imóveis!

Acontece que os Oficiais de Registro de Imóveis têm se recusado a averbar contrato de locação na matrícula de imóvel gravado com propriedade fiduciária sem que haja: a) cláusula específica de afastamento do direito de preferência, o que, por razões técnico-legais, não alcança mesmo os casos de propriedade fiduciária e de perda da propriedade por quaisquer formas de realização da garantia, inclusive leilão público; e b) concordância expressa do fiduciário aos termos da locação.

Dito isso, como fica o empresário frente a eventual arrematante no caso de não se ter averbado o contrato de locação na matrícula do imóvel?

MEDIDAS PARA SE OPOR A EMINENTE PERDA DO PONTO COMERCIAL

Partindo da premissa de que a Lei que trata de alienação fiduciária de coisa imóvel não especifica e nem distancia de seus efeitos imóveis que estejam locados para utilização como ponto comercial, firmamos forte opinião em sentido favorável ao empresário locatário e explicamos o porquê:

Em verdade, entendemos que o requisito da averbação do contrato de locação na matrícula não é absoluto, principalmente quando se trata de empresário estabelecido no imóvel locado.

Quanto a este tocante, quem compra ou aceita em garantia coisa imóvel tem plena capacidade de se inteirar sobre a situação dela e, não se inteirando, aceita por sua conta e risco a coisa imóvel nas condições que lhe foi ofertada. E, estando o empresário regularmente inscrito na Junta Comercial e Receita Federal, cujos dados cadastrais estejam indicando como logradouro o endereço do imóvel alienado, tem-se atendida a finalidade da publicidade, autenticidade, segurança e da eficácia aos atos jurídicos praticados.

Por sua vez, o princípio da preservação da empresa serve de instrumento para qualquer empresário e não apenas para aqueles em situação de crise econômico-financeira. Ou seja, serve inclusive para o empresário locatário, o qual além de não estar em mora com suas obrigações ainda necessita da efetivação do direito à proteção do seu estabelecimento empresarial.

Assim, quando no imóvel está acomodada unidade produtiva da empresa e o empresário tem grande clientela que o reconhece exclusivamente pelo endereço, o correto é que referido imóvel não possa ser retomado em favor de mero direito de crédito ou de propriedade.

Em termos práticos, para que o empresário locatário possa permanecer no imóvel sob esse prisma, mesmo após a arrematação em leilão público por pessoa desinteressada pela locação, pode ele tentar ação judicial para obrigar o arrematante do imóvel a receber os aluguéis e obter a manutenção da locação do imóvel com este ocupando a posição de locador.

Em contrapartida, o empresário locatário, por ter notório interesse na manutenção da locação e na extinção da dívida, pode ingressar com ação judicial para fins de purgar a mora (pagar a dívida) no lugar do fiduciante e cancelar ou suspender eventual leilão público ainda não finalizado. Ao fazer isso, o empresário locatário terá o direito de reembolso junto ao locador/fiduciante, o que inclusive poderá ser feito com compensação dos valores dos aluguéis.

Todavia, se o empresário locatário não quiser purgar a mora do locador/fiduciante e se o contrato não estiver averbado junto à matrícula do imóvel, entende-se caber ação de tutela provisória antecedente, de caráter satisfatório, para que passe a constar da ata do leilão público que o imóvel encontra-se locado com destinação para ponto comercial durante determinado prazo e com cláusula de vigência para caso de alienação, suprindo, desta forma, a necessidade da concordância escrita pelo fiduciário e da conseguinte averbação na matrícula, já que quem vier a arrematar o imóvel no leilão terá plena ciência do contrato e a ele estará vinculado.

Aliás, uma opção que não se dispensa, é a que o empresário locatário pode se antecipar à consolidação da propriedade fiduciária, ingressando com ação contra o locador/fiduciante que esteja inadimplente com o financiamento do imóvel, para nesta ação requerer, em caráter de urgência, o arresto dos direitos deste, admitindo que o locatário passe a saldar a dívida do fiduciante junto ao fiduciário, sub-rogando-se nos direitos e obrigações daí decorrentes após de averbado o termo de arresto na matrícula do imóvel.

RENOVAÇÃO FORÇADA DO CONTRATO DE LOCAÇÃO

Outro ponto que não podemos deixar de lado é que, uma vez preenchidos os requisitos do artigo 51 da Lei do Inquilinato, os quais já abordados em outro artigo (), o empresário tem o direito de almejar ação para renovar compulsoriamente o contrato de locação contra o locador ou posteriores adquirentes que tiverem ciência da relação locatícia.

Assim, se o contrato de locação tiver sido celebrado antes de realizada a alienação fiduciária, para sujeição do fiduciário ou do arrematante aos efeitos da sentença renovatória basta que estejam preenchidos aqueles requisitos do artigo 8º da Lei do Inquilinato; mas se o contrato de locação tiver sido celebrado depois da alienação fiduciária e sem a concordância expressa do fiduciário, a este eventual sentença renovatória não operará nenhum efeito, mas o mesmo não pode se dizer de eventual arrematante, o qual estará obrigado à renovação por força do que dispõe a Lei do Inquilinato.

O EMPRESÁRIO TEM DIREITO À INDENIZAÇÃO

Na pior das hipóteses, em que o empresário não logre êxito em manter seu ponto comercial, assiste a ele o direito à indenização por perdas e danos e por lucros cessantes, cuja cobrança, a depender das circunstâncias, poderá ser demandada em face do locador ou do arrematante.

De longe sem termos esgotado o tema, conclui-se ser sensato que desde o momento da contratação de locação de imóvel para fins não residenciais sejam atendidos todos os requisitos previstos na Lei, dando-se maior segurança e proteção jurídica ao ponto comercial, para o que se recomenda a participação de profissional qualificado e apto a participar de todas as etapas das relações contratuais.

Será que sua garantia no contrato de locação é nula?

ilustraçao para contrato de locação

O erro de inserir mais de uma modalidade de garantia em contratos de locação

Você já se deparou com um contrato de locação no qual se estabeleceu mais de um tipo de garantia?

Em outro artigo, tratei das três garantias mais comuns em contratos de locação: caução, fiança e seguro fiança.

Às vezes, para se sentir seguro, o locador acaba inserindo, sem perceber, mais de uma modalidade de garantia e, com isso, em vez de solução, cria um problema.

Dias desses, ao examinar um contrato de locação, a cláusula que tratava de garantia mencionava fiança e trazia os dados do fiador. No entanto, logo abaixo, havia outra cláusula, dizendo que a garantia de fiança era garantida por determinado imóvel, devendo-se averbar o contrato na respectiva matrícula.

Detalhe que passou despercebido: a lei de locações diz que “É vedada, sob pena de nulidade, mais de uma das modalidades de garantia num mesmo contrato de locação.”

E agora?

Se o contrato em questão mencionou fiança e, ao mesmo tempo, descreveu o que seria, na verdade, uma caução imobiliária, o que seria nulo? Ambas as garantias prestadas? Apenas uma delas?

Essa questão gerou grande controvérsia nos tribunais e como o tema é antigo já existe jurisprudência consolidada dando solução ao dilema.

O Superior Tribunal de Justiça, que é o tribunal máximo a decidir sobre esse tipo de assunto, dispôs que a exigência de dupla garantia em contrato de locação não implica a nulidade de ambas, mas tão somente daquela que houver excedido a disposição legal.

De fato, se há duas garantias estabelecidas; se há necessidade de se preservar a vontade das partes, posto que a intervenção judicial nos pactos privados deve ser vista como uma exceção, basta, para se restabelecer o equilíbrio contratual, que aquela garantia que exceda a legislação seja invalidada.

No exemplo dado, em que as partes declararam no contrato a intenção de garanti-lo por meio de fiança, e, ainda, disseram que o imóvel serviria para garantir a própria fiança, parece-nos que nula será a caução imobiliária impropriamente inserida no contrato e válida será a fiança.

Mas como se faz para resolver o impasse no contrato de locação e prevenir desgastes entre as partes?

Simples: desde que os contratantes estejam de acordo quanto a necessidade de se corrigir a situação, bastará que celebrem um aditivo ao contrato de locação, removendo da contratação uma das garantias.

E se não imperar a concórdia entre os contratantes, como proceder?

Acionar-se o Poder Judiciário, objetivando a adequação da garantia contratual aos termos da legislação aplicável.

Bom, vimos uma questão específica, de nulidade referente a uma dupla garantia, prestada em determinado contrato de locação, mas pode haver outras nulidades, eventualmente merecedoras de correção consensual ou judicial?

Sim, lógico.

A Lei de Locações traz norma que diz serem nulas de pleno direito as cláusulas do contrato que visem a elidir os objetivos da lei, notadamente as que proíbam a prorrogação prevista no artigo 47, ou que afastem o direito à renovação, na hipótese do artigo 51, ou que imponham obrigações pecuniárias para tanto.

E se se deu a garantia de fiança, mas o fiador, embora casado, assinou sozinho o contrato de locação? O que acontece?

Pois é. Neste caso, não tem jeito: a fiança prestada, sem anuência da mulher/ marido, implica na invalidade total da garantia prestada, ou seja, o credor perde a garantia.

E perder a garantia do contrato de locação vem a ser, sem dúvidas, um imenso prejuízo para o locador, que fica, assim, desprotegido caso haja descumprimento do contrato pelo inquilino…

Já havíamos chamado a atenção para este detalhe no artigo anterior, quando falamos das garantias mais comuns nos contratos de locação.

E quem pode solicitar a nulidade da fiança assim prestada?

Não há dúvidas de que o interesse é somente de quem não subscreveu a fiança, por si ou por seus respectivos herdeiros.

Uma vez me trouxeram uma questão curiosa: o fiador, embora casado, se declarou solteiro. E agora, é válida ou não a fiança, inclusive quanto ao outro cônjuge?

Sim, a fiança é válida nesta hipótese, já que não se pode permitir que o fiador que agiu de má-fé frente ao credor, ao ocultar seu real estado civil, se beneficie da própria torpeza. Contudo, eventual execução do fiador não pode alcançar os bens daquela parte do casal que não deu anuência a fiança, ou seja, terá o valor a ela referente preservado.

Precaver-se é a palavra de ordem. Escude-se em profissionais especializados na área quando for fazer seus contratos de locação!

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