Evicção na compra e venda de bens: a perda do bem, se um terceiro for declarado verdadeiro dono

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Quem compra bem móvel ou imóvel pode vir a perdê-lo, se um terceiro for declarado como o verdadeiro dono.

João compra um bem móvel ou imóvel e, tempos depois, por decisão judicial ou ato administrativo, é compelido a entregá-lo para uma terceira pessoa, alheia ao negócio.

Nessa situação, em que João pagou pelo preço, mas perdeu o bem por desconhecer ser seu dono um terceiro, como ficam seus direitos? João teria algum direito a reivindicar? Se sim, de quem poderia reivindicá-lo? Há prazo para isso?

Quando alguém compra um bem e, posteriormente, descobre-se que o referido bem não pertencia a quem o vendeu, mas a uma terceira pessoa, pode ocorrer a “evicção”.

Em linhas gerais, a evicção se dá quando o comprador (evicto) perde o bem, parcial ou totalmente, diante de reivindicação feita por terceiro, o qual, por decisão judicial ou ato administrativo, é declarado como verdadeiro dono do bem (evictor).

Cumpre ressaltar que a evicção e a aplicação de seus efeitos dependem do preenchimento de alguns requisitos. São eles:

Perda parcial ou total do bem, por decisão judicial ou ato administrativo, que declare outra pessoa, que não o vendedor, como sua verdadeira dona;

O bem perdido deve ter sido adquirido pelo comprador (evicto) de forma onerosa ou, quando de forma gratuita, sob condição onerosa, como ocorre, por exemplo, na doação de terreno imóvel para um fim específico, como o de nele ser construída uma casa;

O direito do terceiro deve ser anterior ao negócio firmado entre vendedor e comprador; e,

O comprador não pode conhecer do litígio, hábil a declarar terceira pessoa como a verdadeira dona do bem. Do contrário, estaríamos diante de contrato aleatório, no qual não se aplicam os efeitos da evicção, presumindo-se ter o comprador assumido o risco pela perda da coisa, inclusive para obter desconto no preço.

A título de exemplo, observados os requisitos especificados, pode ocorrer evicção na:

a) compra de um terreno de quem não tem a posse ou a propriedade do bem;
b) compra de um bem posteriormente penhorado e levado a leilão por dívidas do vendedor;
c) compra de um bem sem saber que um terceiro tinha preferência na sua aquisição;
d) compra de um bem desapropriado para utilidade pública; etc.

Contra a perda do bem não há muito a ser feito pelo comprador (evicto), embora a ele prevaleça a “garantia legal” inerente aos efeitos da evicção.

Nesta toada, a legislação, ao antever a possibilidade de evicção nas relações onerosas de compra e venda de bens, estabeleceu que o comprador (evicto), que perde o bem para terceira pessoa (evictor), pode demandar do vendedor a perda. Cobrando dele: (CC, Art. 450):

Restituição integral do preço pago, aqui abarcado o valor do bem ou parte dele à época em que se operou a evicção;
Indenização dos frutos que tiver sido obrigado a restituir ao evictor;
Indenização pelas despesas dos contratos e demais prejuízos resultantes da evicção; e
Ressarcimento das despesas processuais com custas e honorários de advogado.

Na perda parcial do bem, o comprador (evicto) pode pedir a rescisão do contrato e a indenização pelos prejuízos. Não tratando-se de perda significativa e diante do interesse em continuar com o bem, pode requerer apenas indenização proporcional ao preço da parte perdida.

Se houver a perda do objeto por culpa do comprador (evicto) ou fato alheio à sua vontade (força maior ou caso fortuito, a exemplo de furto, roubo ou perecimento da coisa), não será permitida a demanda contra o vendedor.

Com relação ao prazo para que o comprador (evicto) possa exercer o seu direito de demandar pelo recebimento das garantias legais da evicção em face do vendedor, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu ser o prazo de 3 (três) anos, tendo em vista sua natureza indenizatória.

Finalmente, diferentemente do vício redibitório, que consiste em um defeito oculto existente no próprio bem objeto do negócio, na evicção o defeito é formal, inerente à titularidade do direito sobre o bem.

Como se nota, embora o assunto tenha sido abordado em linguagem simples, acessível e didática, não se trata de algo fácil de se compreender ou lidar. Portanto, seja na hora de realizar a compra e venda de bens (momento ideal para se analisar a fundo a respectiva documentação) ou estando diante de aparente “evicção”, é importante procurar um advogado experiente em Direito Civil e contratos, para orientação profissional.

 

Alguns tipos de dívidas que autorizam a penhora de bem de família

Para o Direito Brasileiro, bens de família são os bens que, por proteção legal, não podem ser objeto de penhora em cobrança de dívidas contraídas pelo proprietário ou detentor, salvo exceções previstas em lei, notadamente no artigo 3º da Lei 8.009/1990.

Sensível ao propósito da exceção à impenhorabilidade do bem de família, prevista no inciso II do artigo em epígrafe, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmou posicionamento que afasta argumento de devedores, no sentido de que referida norma deveria ser interpretada restritivamente, alcançando só o agente financeiro, titular do crédito do financiamento para a compra ou construção do imóvel.

Para o Superior Tribunal de Justiça (STJ), a inserção da palavra “financiamento” na norma referida, não afasta a real intenção do legislador de impedir a utilização do benefício legal, como um meio astuto para viabilizar, sem nenhuma contrapartida, e à custa de terceiros, aquisição ou construção de bem de família.

Impenhorabilidade de bem de família não é absoluta!

Nessa linha de raciocínio, a impenhorabilidade não é absoluta, sendo que citada exceção se aplica não só à hipótese em que a cobrança seja de dívida decorrente de “financiamento” para construção ou compra de imóvel, mas também a outras hipóteses em que a dívida, embora de natureza diferente, seja contraída exatamente para o mesmo fim, notadamente para construir ou comprar imóvel.

A título de exemplo, o bem de família pode ser objeto de penhora quando a ação é movida para cobrança de dívida decorrente de contrato de compromisso de compra e venda do imóvel; o que ocorre quando “João”, devedor, deixa de pagar parte do preço pactuado para a compra do imóvel a “Fred”, credor.

O mesmo acontece quando João deixa de pagar parte do preço acordado para comprar o terreno onde edificou, com dinheiro próprio, a casa que serve de residência da família.

Em ambos os casos, se João promete pagar a Fred R$ 100.000,00 (cem mil reais), nada mais justo e correto do que permitir que Fred (titular do crédito decorrente da venda do imóvel) penhore os direitos que aquele detém sobre o bem objeto do negócio inadimplido.

Também se admite a penhora do bem de família para saldar dívida cuja origem seja de contrato de empreitada global celebrado para a construção do imóvel; entendendo-se por “empreitada global” a empreitada que possibilita toda a construção do imóvel, por executar as obras e fornecer os materiais.

Portanto, aconselha-se a quem pretende fechar negócio de construção ou compra de bem imóvel que o faça sob orientação de profissional capacitado no assunto, de modo a não ficarem dúvidas sobre as peculiaridades e riscos envolvidos no negócio.

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Área do direito:
Direito Civil

 

Imóvel doado para os filhos pode ser penhorado em ação movida contra o doador?

penhora de bens de família

Fraude, bem de família e outros contrapontos

Para o tema deste artigo, pensemos na hipótese específica de um pai endividado que acaba fazendo a doação de seu único bem imóvel para os filhos. Essa doação pode ser questionada pelo credor, de modo que referido bem possa servir de objeto para a liquidação da dívida?…

Antes de seguirmos com a resposta da indagação, cerne deste artigo, tenhamos em mente que existem pelo menos dois tipos de devedores.

Há aquela pessoa que vive endividada e não demonstra a menor responsabilidade ou preocupação com relação a seus credores, e há aquela pessoa que, embora responsável, por questões circunstanciais (ex.: perda de emprego; falta de educação financeira; etc.), deixou de ter condições de arcar com a dívida assumida.

Note-se que o pai que nos serve de exemplo se encaixa nesse segundo tipo de devedor.

Como sabemos, diante do não pagamento da dívida, o credor pode tomar medidas judiciais para a cobrança de seu crédito. Essas medidas buscarão bens do pai endividado que, localizados, serão objeto da chamada “penhora”.

Imagine que o credor descubra que o devedor doou seu único bem – um imóvel – aos filhos, que nele residem, e fez isso em data posterior à existência da dívida.

Pode o credor, então, pedir ao juiz, sob o argumento de fraude, para que permita que a penhora recaia sobre esse imóvel?

Fato é que, na prática, são muitos os juízes que acatam esse tipo de pedido. Em isso acontecendo, o que poderia se feito em favor do pai ou de seus filhos?

Pois bem, quando se fala em fraude, é preciso lembrar que o seu reconhecimento exige a existência de alguns requisitos, a serem comprovados pelo credor. São eles:

1º – a constituição do crédito pelo pai precisa ter ocorrido em data anterior à da doação;

2º – é preciso demonstrar que os filhos sabiam que, com a doação, o pai perderia a capacidade de pagar sua dívida;

3º – o credor precisa demonstrar, ainda, que a doação foi realizada em seu prejuízo, o que decorre pela alteração da finalidade de uso do bem ou pelo desvio de proveito econômico obtido.

No caso retratado neste artigo, afirmo a ocorrência dos dois primeiros requisitos, ou seja, a dívida já existia quando a doação foi feita pelo pai e os filhos conheciam as circunstâncias e consequências do ato.

Contudo, fica a questão: a doação foi feita em prejuízo do credor, alterando-se a finalidade de uso ou pelo desvio de proveito econômico obtido?

Creio que não, e explico o porquê:

O devedor doou bem imóvel que servia para sua moradia e a de seus filhos, e referido bem continuou a ser utilizado como moradia da família, ou seja, não houve alteração da finalidade de uso do bem. E nem há de se pensar que, no caso, houve algum desvio de proveito econômico, porque a doação é ato gratuito.

Logo, se em caso como o exemplificado o juiz acata pedido do credor, o devedor, que no caso é o pai, ou os donatários, que são os filhos, poderão se opor contra a “penhora” do bem, sob o argumento de não caracterização de fraude.

E em acréscimo a esse argumento, existe a proteção legal que impõe a impenhorabilidade de imóvel do devedor, que sirva de moradia para sua família.

Dessa forma, depois de apresentadas manifestações no processo de parte a parte, cabe ao juiz ponderar entre a proteção do bem de família e os direitos do credor.

Registra-se mais: além da ausência dos requisitos caracterizadores da fraude e a proteção a bem de família, o devedor ainda pode suscitar certas peculiaridades para afastar qualquer interpretação de que ele tenha tido intenção de fraudar credores. Uma delas, e que é bastante comum, é a menoridade dos filhos para os quais houve a doação do imóvel em que residem.

Aliás, há precedentes do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a impenhorabilidade da metade do bem de família, relativa à meação da esposa ou marido que não tenha participado da dívida, seja estendida à totalidade do bem.

E isso acontece, por exemplo, quando o marido e esposa doam o bem para os filhos.

Se o marido é quem contraiu a dívida e esta não foi revertida em benefício do lar, não há como se falar em fraude de credores pelo menos com relação à metade que pertencia e foi doada pela mãe.

Logo, a doação da metade do imóvel pertencente à mãe não pode ser considerada fraudulenta e está protegida pela impenhorabilidade, que deve ser estendida à totalidade do bem, inclusive por ser ele destinado à moradia da família.

Portanto, se você é devedor ou caso conheça devedor que se encontre nessa situação, procure um advogado especializado.

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